Quem acompanha a trajetória de Warren Buffett há mais tempo sabe que ele sempre foi um grande crítico de Wall Street e sua cultura de extravagância. Porém, foi isso mesmo que você leu, ele realmente foi CEO de um banco em Wall Street.
Em 1991, o lendário investidor de Omaha, assumiu como CEO e Chairman do poderoso Salomon Brothers, um dos maiores bancos de investimento de Wall Street da época.
Para entender melhor essa história, precisamos voltar para os anos 80.
O Rei de Wall Street
Para quem nunca ouviu falar, o Salomon Brothers era o banco de investimentos que mandava no mercado financeiro norte-americano na década de 80, tendo recebido o título de “O Rei de Wall Street” pela prestigiada revista Business Week.
No entanto, após um longo período lucrando mais do que todos em Wall Street e presenteando seus traders com milhões de dólares em bônus todos os anos, os resultados da firma de investimentos tiveram uma queda significativa em 1986.
Com os números muito abaixo do esperado e o fraco desempenho de suas ações em relação ao índice Dow Jones, o maior acionista do Salomon, a sul-africana Minorco, decidiu que iria vender a sua participação no banco e informou ao board que já tinha um comprador para a suas ações: o temido Ron Perelman.
White Knight
O CEO do Salomon Brothers, John Gutfreund, numa tentativa desesperada de impedir que Perelman assumisse o controle do seu banco, ligou para Buffett pedindo sua ajuda.
A ideia de Gutfreund era convencer Buffett a investir no Salomon, com o objetivo de salvar o banco de ser comandado pelo polêmico bilionário Ron Perelman, um famoso ‘corporate raider’ conhecido por comprar companhias e vender suas partes separadamente no mercado, uma prática muito comum nos anos 80.
Sentindo o cheiro de oportunidade, Buffett aceitou se tornar acionista do banco de Gutfreund, e investiu US$ 700 milhões em ações preferenciais do Salomon Brothers Inc., garantindo um retorno de 15% ao ano para a Berkshire Hathaway.
O deal foi oficialmente fechado durante o feriado do Rosh Hashaná, o ano-novo judeu, de 1987, período em que Gutfreund sabia Perelman estaria neutralizado por ser extremamente religioso e portanto, não teria como contra-atacar.
Os Aristocratas do Salomon
Embora o investimento parecesse fazer bastante sentindo em termos financeiros, garantindo um retorno adequado para o capital da Berkshire Hathaway, logo os problemas começaram a aparecer.
Buffett e seu lendário sócio Charile Munger, ficaram chocados com os bônus milionários dos traders do Salomon, especialmente da divisão de arbitragem.
Para se ter uma ideia, um dos traders, Larry Hilibrand, chegou a ganhar US$ 23 milhões de bônus em um ano.
“Acredito em pagar por talento, mas não como se as pessoas fossem aristocratas”, disse Buffett.
Os bônus dos traders, no entanto, era o menor dos problemas.
O Escândalo Mozer
A cultura de excessos e o ambiente extremamente competitivo era uma das principais marcas do Salomon, porém, o banco até então sempre se manteve na linha, respeitando todas as regulamentações das entidades norte-americanas.
Eis que um trader chamado Paul Mozer, responsável pelo departamento de títulos governamentais do Salomon e não satisfeito com seu bônus de US$ 4,75 milhões, resolveu fazer um esquema para ganhar mais dinheiro.
Em 1991, foi descoberto que Mozer estava manipulando os leilões de títulos realizados pelo Departamento do Tesouro Americano, com o intuito de beneficiar o Salomon Brothers frente aos seus competidores, e consequentemente, aumentar os lucros do seu departamento.
A fraude foi revelada por uma investigação interna do banco liderada pelo seu departamento jurídico, e assim que foi informada para as autoridades e para a imprensa, o Salomon sofreu um forte golpe em sua reputação.
A Reputação de Buffett
Além das fraudes cometidas por Mozer, o fato dos diretores saberem dos acontecimentos e não terem tomado nenhum medida para punir o seu colaborador, causou um impacto negativo na relação do banco com as autoridades.
Como resposta, o Departamento do Tesouro anunciou que o Salomon Brothers estava proibido de participar dos leilões, tanto em nome dos clientes quanto em seu próprio nome.
Uma medida extrema e que poderia levar o banco à falência, visto que essa era uma das suas principais linhas de negócio.
Warren Buffett, já um dos homens mais ricos e respeitados do mundo na época, se encarregou de falar com o Tesouro e colocou sua reputação em jogo para tentar reverter a decisão.
O Oráculo de Omaha fez o possível para tentar convencer Nick Brady, o então Secretário do Tesouro, para reverter a decisão tomada, explicando as implicações que teriam no mercado financeiro global caso o Salomon fosse a falência.
Uma das condições, além de afastar os envolvidos no caso Mozer, seria que o próprio Buffett assumiria como presidente interino do conselho do Salomon, e tomaria as medidas necessárias para reverter a delicada situação em que o banco se encontrava.
A jogada de Buffett deu certo, e o Tesouro anunciou que a decisão seria parcialmente revertida, permitindo que o Salomon continuasse a fazer lances nos leilões, porém, apenas em seu nome.
Sob o comando de Buffett, que ocupou o cargo até 1992, o Salomon passou por uma grande reestruturação e lentamente conseguiu se recuperar do golpe sofrido.
Aftermath de Buffet
O Salomon estimou que os US$ 4 milhões que Mozer ganhou de forma ilegal com suas operações, custaram à firma US$ 800 milhões em transações perdidas, multas e despesas legais.
O banco fechou um acordo de US$ 100 milhões com a SEC para não ser indiciado. Paul Mozer ficou preso por quatro meses, pagou uma multa de US$ 1,1 milhão e foi afastado do setor para o resto da vida.