Antes mesmo de Mark Zuckerberg e outros gênios da indústria da tecnologia atual saírem do berçário, um homem já utilizava algoritmos e modelos computacionais para fazer fortuna. Jim Simons, que se transformou, aos 44 anos, no maior “money maker” da história das finanças modernas.
Ninguém no mundo dos investimentos chega perto dele. Warren Buffett, George Soros, Peter Lynch, Steve Cohen ou Ray Dalio – nenhum desses performou como James Harris Simons, o homem que decifrou o mercado financeiro.
Só pra você ter uma ideia, desde 1988, um dos hedge funds comandados por Jim, o Medallion, gerou retornos anuais médios de 66%. No total, ele acumula incríveis US$ 100 bilhões em lucros em suas operações.
E essa grana não foi só pro bolso dele. Em média, um funcionário da empresa fundada por Jim, a Renaissance Technologies, possui US$ 50 milhões somente em fundos hedge da própria empresa.
Com um estilo de investimento considerado radical, o ex-professor utilizou seu conhecimento na matemática para criar sua própria metodologia de investimentos, e construiu, depois de anos de aprendizado, programas de computador capazes de digerir toneladas de informações de mercado e selecionar as negociações ideais. Uma abordagem quantitativa, que visa eliminar a emoção e o instinto do processo de investimento.
Prodígio
James Harris Simons nasceu na primavera de 1938. Filho de um executivo de uma fábrica de calçados de Boston, logo muito cedo desenvolveu um amor platônico pela matemática. Aos três anos, ele já tinha a mania de multiplicar números por dois e os dividir pela metade, descobrindo todas as potências de 2 até 1024.
Sua mãe, Marcia Simons, era voluntária na escola do filho, mas nunca teve oportunidade de trabalhar fora. Com quatro anos, enquanto viajava para a praia com a família, Jim se deparou com um clássico problema de lógica: o Paradoxo de Zenão.
Quando Jim tinha apenas 8 anos de idade, o médico da família sugeriu que ele também seguisse a medicina, dando a entender que era uma profissão perfeita para um brilhante menino judeu. Ele logo retrucou: “Quero ser matemático ou cientista”. O médico chegou a tentar dissuadir o jovem James, dizendo que sendo matemático ele não ganharia muito dinheiro. Ironicamente, o Dr. Kaplan estava profundamente enganado.
Na escola, Jim também demonstrava ser um menino acima da média. Amava livros, chegava a locar quatro deles por semana na biblioteca local da cidade. Muitos desses, bem acima do seu nível escolar. Ele era um menino especialmente curioso.
E após o nono ano da escola, a família Simons se mudou de Brookline para Newton, ambas cidades do Estado de Massachusetts. Lá, Jimmy frequentou a Newton High School, uma escola pública, mas bem equipada, onde ele pode nutrir ainda mais suas paixões. Jim já era 100% consciente de que a matemática estava no seu futuro. Ele só não sabia que esse futuro seria extremamente brilhante
Jim e MIT
Depois da escola, Simons entrou para o MIT, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts, e até mesmo pôde pular o primeiro ano de matemática graças aos cursos avançados que ele fez ainda no ensino médio. Mas apesar da clara genialidade, Jimmy encontrou muitos desafios logo de início. O estresse da faculdade chegou a deixá-lo doente e o jovem rapaz perdeu 10kg após passar duas semanas no hospital.
Um belo dia, Jim viu dois de seus professores, os renomados matemáticos Warren Ambrose e Isadore Singer, em uma discussão profunda após a meia-noite em um café local. Jim teve uma epifania. Ele decidiu então que queria aquele tipo de vida para si: cigarros, café e matemática a qualquer hora do dia.
Em 1958, após três anos de MIT, Simons tinha créditos suficientes para se formar com apenas 20 anos e recebeu o diploma de bacharel de Ciências em Matemática. Mas antes de entrar na pós-graduação, ainda jovem, ele queria viver uma aventura. Junto de dois de seus grandes amigos, Rosenshein e Mayer, Jim decidiu que era hora viajar pela América do Sul a bordo de motocicletas Vespas.
E pra isso, criou um plano, com o argumento de que essa viagem seria digna de virar notícia. Depois de convencer duas concessionárias locais a darem descontos na compra de uma Lambretta para cada um em troca do direito de filmar a viagem, os jovens embarcaram na viagem que apelidaram de “Buenos Aires ou Fracasso”.
Na viagem, Jim chegou a correr risco de vida. Os dois companheiros de Jim acabaram tornando-se posteriormente os seus primeiros sócios. Mas quando Simons voltou ao MIT, para começar sua pós-graduação, seu orientador sugeriu que ele terminasse o doutorado na Berkeley – a Universidade da Califórnia.
Para sua tese de doutorado, Jim queria desenvolver uma comprovação para um problema que vários matemáticos do mundo haviam tentado e não conseguiram: A Transitividade dos Sistemas Holonômicos – a qual não vamos nem ousar aqui tentar explicar.
Em 1962, após somente dois anos de trabalho, Simons concluiu o estudo.
Uma revista acadêmica publicou a tese, ajudando-o a ganhar um cargo de prestígio para lecionar durante três anos no MIT. Mas o que interessa mesmo, é que nessa mesma época Jim descobriu uma nova paixão: o mercado financeiro.
Guerra e Matemática
Simons pegou um pouco de dinheiro que tinha, cerca de US$ 5 mil, e foi até uma empresa de corretagem chamada Merrill Lynch. Lá ele comprou ações da United Fruit Company, uma empresa que vendia frutas tropicais na época. Esse foi um dos seus primeiros investimentos. O problema é que o preço da ação não saia do lugar, o que logo de início frustrou o jovem matemático.
Simons sentiu que precisava ser mais ousado, e começou a voltar seus olhos para os mercados futuros – o que acabou se tornando uma grande obsessão. Depois de comprar dois contratos futuros de soja e ver os preços saltarem, Jim ganhou milhares de dólares em questão de dias. Mas como um bom iniciante, não ficou atento à volatilidade do mercado que acabou caindo um tempo depois.
Mesmo perdendo seu dinheiro, Simons ficou fascinado com a possibilidade de lucrar no curto prazo e essa seria uma experiência muito importante no futuro. Em 1963, Jim aceitou um cargo de pesquisador em Harvard. Lá, lecionou duas disciplinas, incluindo um curso avançado de pós-graduação sobre equações diferenciais parciais. Um ano depois, Jim acabou abandonando a universidade para entrar em um grupo de inteligência, contratado pelo instituto de análise de defesa.
A organização, financiada pelo governo americano, contratou matemáticos para ajudar a quebrar os códigos de espionagem soviéticos durante a Guerra Fria. Essa foi outra experiência extremamente importante na carreira de Jimmy. O IDA, Institute for Defense Analysis, foi fundamental para ensinar Jim, com 26 anos, a desenvolver modelos matemáticos para interpretar padrões de dados que aparentemente não faziam nenhum sentido.
Você já consegue imaginar que esses modelos seriam um embrião para a metodologia criada e aplicada por ele, posteriormente, no mercado financeiro. Até então, Jim Simons trabalhava com uma matemática teórica. Agora, ele começou a ter maior contato com análise estatística e a teoria da probabilidade, ferramentas matemáticas que influenciaram seu trabalho dali pra frente.
Para decodificar, ele primeiro determinava um plano de ataque. Depois, criava um algoritmo – uma série de passos para seu computador seguir. E por último, testava e implementava a estratégia. O IDA cedia a seus pesquisadores uma notável flexibilidade no trabalho, portanto, Simons passava o tempo examinando também o mercado de ações. Ao mesmo tempo que Simons alcançava o sucesso em codificação e matemática, ele continuava buscando novas formas de ganhar dinheiro.
Wall Street, Jim e a Matemática
Trabalhando com alguns colegas do IDA, Jim desenvolveu um sistema ultramoderno de operação na bolsa. Junto de três outros pesquisadores, publicou um artigo interno e confidencial para o IDA chamado “Modelos Probabilísticos para a Predição do Comportamento do Mercado de Ações”.
Simons e seus colegas ignoraram informações básicas nas quais a maioria dos investidores se concentrava, como lucro, dividendos e notícias corporativas.
Em vez disso, eles se concentraram em buscar um número pequeno de “variáveis macroscópicas” capazes de prever o comportamento no curto prazo. Para a maioria dos investidores, essa era uma abordagem nunca vista. A maioria buscava por um pensamento racional econômico, analisando balanços e os números das empresas. Ou usavam uma análise técnica simples, com o uso de gráficos e os últimos movimentos dos preços das ações – buscando padrões simplificados.
Simons e seus colegas estavam propondo uma terceira abordagem, de certa forma semelhante à operação técnica, mas muito mais sofisticada – contando com a ajuda de ferramentas da matemática e da ciências. Mas apesar do pioneirismo, o artigo de Simons e seus colegas era ainda muito rudimentar. Algumas suposições eram ingênuas, como, por exemplo, não incluir nenhum custo de operação – embora o modelo exigisse muitas operações diárias.
Com 29 anos, Simons acabou sendo demitido do DIA.
Na época, a guerra do Vietnã acontecia e o chefe da organização, que era um grande entusiasta do conflito, escreveu uma reportagem para o New York Times sobre como os Estados Unidos venceriam aquela guerra. Jim achava que a guerra era estúpida. E decidiu também escrever uma carta que foi publicada. Ele dizia que nem todos que trabalhavam na organização concordavam com a opinião do chefe. O resultado foi a demissão.
Desapontado, Jim voltou a trabalhar como professor. Mas dessa vez na Stony Brook University, em Nova York. Mas apesar de voltar a lecionar, o gênio da matemática estava cada vez mais perto de Wall Street.
Monometrics
Simons nunca se encaixou por completo no mundo acadêmico. Apesar de amar geometria e apreciar a beleza da matemática, sua paixão por dinheiro e sua curiosidade pelo mundo dos negócios o afastava de seus colegas. Em 1978, aos 40 anos, ele decidiu deixar de vez o mundo acadêmico para abrir sua própria empresa de investimentos – focada em operações com moedas: o Monemetrics.
Seu primeiro passo foi convidar um velho amigo da IDA, Leonard Baum, para ser seu sócio. Baum também era um gênio da matemática e é o criador do famoso Algoritmo Baum-Welch – que foi extremamente importante para o desenvolvimento do fundo.
Simons também criou, na época, o seu primeiro fundo Hedge: o Limroy. Ele decidiu que a Monemetrics iria investir pouco dinheiro, testando as estratégias em diversos mercados. Se as táticas fossem lucrativas, ele faria as mesmas operações no Limroy, que era muito maior e investia tanto para pessoas de fora quanto para Jim e Baum. Baum participava do corte de 25% que a empresa reivindicava de todos os seus lucros de operação.
Ambos estavam convencidos de que poderiam ganhar muito dinheiro contando com um estilo de operação que combinasse modelos matemáticos, gráficos e uma forte dose de intuição humana. Mas os modelos ainda eram precários.
Certa vez, o sistema computacional desenvolveu um apetite incomum por batatas, transferindo dois terços do caixa do fundo para contratos futuros da Bolsa Mercantil de Nova York – que representava milhões de quilos de batatas. Um dia, Simons recebeu uma ligação de reguladores do mercado que estavam, vamos dizer, infelizes. A Monemetrics estava perto de monopolizar o mercado global de batatas.
Simons teve que segurar o riso e explicar aos reguladores que ele não pretendia juntar tantas batatas. Ele nem conseguia entender direito por que seu sistema computacional estava comprando aquele ativo. Irritados, os reguladores não entenderam o que Simons dizia e fecharam as operações – o que custou milhões de dólares ao fundo.
Mas entre erros e acertos, as coisas estavam dando certo.
Renaissence
Depois de perceber que poderiam ter muito sucesso aplicando os modelos matemáticos que estavam desenvolvendo, Simons e Baum começaram a reunir equipes de matemáticos para trabalhar. Além disso, conseguiram convencer outros gênios da matemática conhecidos para se juntarem a eles. Em 1982, Jim renomeou o Monemetrics para Renaissance Technologies. O lendário Hedge Fund, que mudaria o mercado financeiro para sempre, nasceu.
Na época, os computadores ainda estavam engatinhando. A tecnologia para um sistema totalmente automatizado não existia. Jim e sua equipe precisaram coletar grandes quantidades de dados históricos e alimentar diretamente os computadores que possuíam. Eles compram pilhas e mais pilhas de livros do Banco Mundial, e de outros lugares, juntamente com bobinas magnéticas de várias bolsas de commodities – que traziam os históricos de preços desde antes da Segunda Guerra Mundial.
A ideia era analisar os movimentos do mercado antigo em busca de padrões consistentes que pudessem ser aplicados ao presente. Apesar de enfrentarem críticas de um mercado cético, Simons e sua equipe estavam determinados. Com o desenvolvimento dos computadores da época, o fundo começou a investir em máquinas cada vez melhores.
Nesse período, outro matemático passa a fazer parte do trabalho: James Axe. Ele era um colega difícil. No escritório, adorava divulgar teorias da conspiração, especialmente aquelas envolvendo o assassinato do ex-presidente dos Estados Unidos John Kennedy. Ele exigia que os funcionários se referissem a ele como Dr. Axe, por respeito ao seu doutorado – mas a maioria recusava.
Ao mesmo tempo, Axe era extremamente competitivo – chegando a conquistar o terceiro lugar no Campeonato Mundial Amador de Gamão, sendo até mencionado no New York Times ao longo do caminho. Mas ele descobriu que operar na bolsa era mais cativante que qualquer outro desafio que ele pudesse encontrar.
Na época, Simons e Axe estavam propondo construir um sistema inicial de Machine Learning – um termo muito usado atualmente, mas que já era explorado pelo fundo na década de 80. Quando a equipe começou a testar o mais novo modelo, eles rapidamente tiveram ótimos retornos. O que fez Simons passar a investir milhões dólares nesse sistema, que eles batizaram de Medallion Fund.
Além disso, Jim continuou a contratar talentos da matemática para seguir aprimorando os algoritmos e melhorando as previsões. Ellyn Berlekamp é um deles. Ellyn acabou tornando-se totalmente responsável pelo Medallion, e começou a implementar totalmente suas ideias com o tempo. Para Ellyn, o algoritmo deveria aprender a lidar com as negociações como cassinos. O cassino não se importa com nenhuma aposta específica.
Mesmo que um apostador ganhe 10 vezes, por exemplo, o cassino fica feliz. Porque sabe que no longo prazo é a casa que tem a vantagem estatística. A verdade é que o grande segredo da Renaissence foi combinar o poder da computação com a abordagem científica que ia melhorando a cada dia. A busca era sempre a mesma: descobrir padrões de negociações, validá-los e negociar com base neles.
Jim e os matemáticos do fundo seguiram coletando padrões e anomalias ao longo do tempo. Em 1990, o Medallion atingia 55,9% de ganho e a incrível sequência do fundo começou…
O Mercado de Ações e Jim
Até esse momento o fundo teve muito sucesso na negociação de commodities, mas não tinha grandes lucros negociando ações O tamanho do fundo também começou a ser um problema. Vamos supor, por exemplo, que você esteja tentando comprar 10 milhões de ações da Apple. São tantas ações, que vai demorar um tempo para o mercado atender esse pedido.
E quando os pedidos forem preenchidos, provavelmente você não vai conseguir o preço que havia planejado inicialmente. Isso era exatamente o que estava acontecendo com o Medallion, era preciso ampliar o seu portfólio de ativos e pra isso era necessário melhorar a rentabilidade das operações no mercado de ações.
Em 1993, Simons contratou dois cientistas de ponta da IBM, Bob Mercer e Peter Brown, e começou a incubá-los para criar modelos para esse mercado. Depois de dois anos, o fundo pôde crescer de 30 milhões para quase 2 bilhões de dólares em ativos sob gestão. Em 2000, Jim já administrava 6 bilhões de dólares e tinha 140 funcionários – e o resto, meus amigos, é história.
Em 2003, a Renaissance aumentou suas taxas de administração e expulsou todos os investidores externos. Com a saída, os funcionários passaram a poder obter ganhos para si próprios. Durante a crise financeira de 2008, enquanto o mercado caiu 37%, o Medallion teve um retorno de 152%, antes das taxas – o seu melhor ano desde sempre. Em 2020, Simons se aposentou e, só naquele ano, embolsou mais de 1 bilhão de dólares.
Seu objetivo na época era ganhar mais tempo para se dedicar a outras áreas. Incluindo a instituição social The Simons Foudation. Mesmo deixando o protagonismo da Renaissance, Jim Simon continua sendo um dos maiores nomes do meio. O que separa Jim de outros vários administradores de Hedge Funds é sua incrível capacidade de contratar talentos e de criar um ambiente perfeito para que elas utilizem seu máximo potencial.
No ranking da revista Forbes, Jim Simons ocupa a 50ª posição entre as pessoas mais ricas do mundo, com uma fortuna estimada em US$ 30 bilhões.